Faith-Ann A. McGarrell

"Vem e segue-Me"

Lembro-me de que quando criança na escola, eu me divertia com brincadeiras como “Siga o líder!”, “O mestre mandou!” e “No rio, na margem!”. Nessas brincadeiras, meus amigos e eu aprendemos a ouvir e seguir instruções. Essas competências adquiridas durante as brincadeiras na infância revelaram-se benéficas na idade adulta, quando o caminho da vida parecia incerto ou as situações se mostravam desconhecidas. No entanto, também me lembro de ter ouvido avisos como: “Só porque seus amigos estão fazendo isso, não significa que você tenha que fazer também!” Em outras palavras, tome cuidado com quem você segue. E isso é verdade em todas as áreas da vida.

Esses pensamentos me vêm à mente toda vez que leio a história do chamado de Jesus nos Evangelhos. Em Mateus 4:18-22, Marcos 1:16-20 e Lucas 5:1-11, temos um registro da interação de Jesus com aqueles que se tornariam Seus primeiros discípulos: André, Simão Pedro, Tiago e João. “Sigam-me”, disse Jesus, “e eu os farei pescadores de homens” (Mt 4:19).1 Na primeira leitura, parece simples: Jesus chamou, eles seguiram. No entanto, acredito que houve mais que isso. Vários pontos ressoam na reflexão sobre essa história e ao considerar os artigos incluídos nesta edição. Nessa passagem da Escritura e no contexto que a rodeia, Jesus convida os discípulos a segui-Lo; nesse convite, eles encontram seu propósito e, ao fazê-lo, ganham confiança Naquele que escolhem seguir. E nós também podemos vivenciar a mesma experiência.

No convite de Jesus há certeza. A palavra “seguir”, conforme usada nessa passagem, é definida como o chamado para “sair” ou “conhecer, reconhecer ou perceber”. Em essência, deixar de lado tudo o mais e conhecer com certeza.2 A maioria das pessoas tem uma resposta à palavra “seguir”, uma palavra que, como muitas palavras da língua portuguesa, tem conotações positivas e negativas. Quando chamados de “seguidores”, alguns percebem esse atributo como uma fraqueza e consideram qualquer pessoa que a demonstre como indecisa ou passiva. Existe até um ditado popular que afirma: “Seja um líder, não um seguidor.” Felizmente, na literatura atual sobre liderança, os pesquisadores adotam o termo “seguidores”3 e reconhecem que, para avançar em qualquer situação, seguidores e líderes devem trabalhar juntos.

A cada mês, o TikTok registra um bilhão de usuários. Desse número, a maior porcentagem está na faixa etária de 10 a 19 anos. Em todas as plataformas de mídia social, os usuários mais ativos, que representam 88% do total, são do grupo demográfico de 18 a 29 anos.4 Pode não haver relacionamento pessoal entre os usuários e qualquer um dos indivíduos que eles seguem, e a conexão pode ser superficial, no entanto, a atração existe. Por quê?

Uma razão é que os humanos têm um desejo nato de ser conhecidos e vistos. Nesta edição da JAE, os autores do artigo “Discipulando o aluno integralmente” (“Discipling the Whole Student” - Scott R. Ward et al.), referem-se à pesquisa conduzida pelo The Springtide Research Institute. Um relatório de 2022 desse estudo longitudinal sobre “Pertencer” indica que um em cada três jovens experimenta solidão persistente; 40% sentem-se isolados e despercebidos; e 45% se sentem incompreendidos.5 Os envolvidos no estudo pertencem ao grupo demográfico dos 13 aos 25 anos, a mesma população que inclui os seguidores de muitos gurus e influenciadores das redes sociais.

O estudo descobriu que, se os jovens têm, pelo menos, uma pessoa de confiança em sua vida, eles experimentam menos sentimentos de solidão, isolamento e estresse. Esse benefício aumenta se é maior o número de conexões que esse jovem experimenta. Springtide chama isso de processo de pertencimento, que se refere a três tipos específicos de experiências encontradas nas histórias daqueles que tinham um senso de pertencer: “sentir-se notado, sentir-se nomeado e sentir-se conhecido.”6

Quando André e Pedro, e mais tarde Tiago, João e os outros, ouviram o chamado de Jesus, acredito que a resposta deles foi mais do que seguir uma personalidade ou uma marca. Acredito que, quando Jesus disse: “Siga-me”, havia em Sua voz a promessa de certeza, de potencial realizado. Era a voz do GRANDE EU SOU – a voz Daquele que os conhecia, que os via, que compreendia seus desejos mais profundos e não expressos. Aquele que disse: “Antes de formá-lo no ventre eu o escolhi; antes de você nascer eu o separei” (Jr 1:5).

A educação adventista é onde apresentamos aos alunos Aquele que os criou, morreu por eles e que os conhece intimamente – suas alegrias, tristezas, esperanças e aspirações. Mas a educação adventista não é apenas para filhos de adventistas, é para TODOS os filhos de Deus. Um lugar onde TODAS as crianças, independentemente das circunstâncias ou experiências, podem saber e clamar como Hagar – ou como Abraão, Isaque e Ana – que “Tu és o Deus que me vê” (Gn 16:13). No chamado de Jesus está a certeza de que somos notados, nomeados e conhecidos por Aquele em Quem todo o nosso potencial pode ser realizado.

Nesse convite, os discípulos encontram o seu propósito. O convite não é sobre conforto, mas, sim, coragem para cumprir nosso propósito. Duas definições adicionais de seguir são usadas – “acompanhar” e “ajudar”. Jesus chamou os discípulos para acompanhá-Lo, para auxiliá-Lo na Sua missão de fazer discípulos para o reino: “e sereis pescadores de homens.”7 E Ele nos convida a fazer o mesmo. Os pescadores da época de Jesus viviam vida difícil. A ocupação árdua exigia habilidade, paciência e tenacidade. Eles suportavam calor e frio extremos; usavam redes, cestos, lanças, anzol e linha e, às vezes, até as próprias mãos para pescar. Eles aprenderam cedo como classificar os vários tipos de peixes e determinar como cada um poderia ser usado; aprenderam a fazer, consertar e manter suas redes para que pudessem acompanhar a indústria.8 Era preciso coragem para viver como pescador.

Então, que significado teria para eles ouvir Jesus dizer: “‘e sereis pescadores de homens”? Homens? Como os peixes do mar? Todos os tipos de homens em todos os tipos de circunstâncias? Homens que exigiriam paciência, habilidade e cuidado? Homens que precisariam deles mais do que eles poderiam dar com suas próprias forças?

Em Lucas 5:1-11 lemos a mesma história sob outra perspectiva e, nessa versão, Jesus opera um milagre após uma situação difícil. Depois de pescar a noite toda e não pegar nada, Simão Pedro atende ao pedido de Jesus para usar seu barco. Em troca, Jesus o instrui a lançar sua rede nas profundezas. Pedro está cético – eles pescaram a noite toda sem sucesso. No entanto, quando Simão Pedro vê as redes repletas de peixes e os barcos afundando com o peso da pesca, somos informados que ele “prostrou-se aos pés de Jesus e disse: ‘Afasta-te de mim, Senhor, porque sou um homem pecador!’” (Lc 5:8). Como Isaías, que declarou: “Ai de mim! Estou perdido [...] meus olhos viram o Rei, o Senhor dos Exércitos!” (Is 6:5), e como nós, quando sentimos o peso do que é exigido de nós durante este período em que vivemos – as demandas, as crises e os desafios aos princípios de fé de longa data –, Pedro teve um vislumbre da sua própria humanidade frágil e falível e sentiu na alma a necessidade de um Salvador. Acredito também que naquele momento nasceu a confiança e a certeza de que em Jesus TODAS as coisas eram possíveis. Para nós, hoje, permanece o mesmo. Somente quando reconhecermos a nossa dependência do divino9 poderemos responder verdadeira e humildemente ao chamado: “Vem e segue-Me.”

Jesus respondeu ao clamor de Pedro com palavras de conforto e uma promessa: “Não tenha medo; de agora em diante você será pescador de homens.” A expressão SERÁ é afirmativa! Ela grita: “certeza no futuro”. Esse mesmo EU SOU que estava com Moisés (Êx 3:14) promete nos capacitar para Sua missão de sermos “pescadores de homens” mesmo em tempos desafiadores. Como educadores adventistas, encontramos todos os tipos de estudantes e famílias e precisaremos saber a melhor forma de alcançá-los, nutri-los e mantê-los.

Desde o início, as escolas adventistas do sétimo dia têm sido “redes” capturando a todos, ensinando a todos, nutrindo a todos. E devemos continuar o nosso compromisso de nos tornarmos hábeis em fazê-lo contra as mudanças nas marés sociais, políticas, econômicas e religiosas. Desde aprender como usar novas tecnologias como IA Generativa (David P. Harris e Fred Armstrong), até aprender como navegar e manter a imparcialidade nos conselhos escolares adventistas (Robert Crux); da administração (mordomia) do meio ambiente (Desmond Hartwell Murray) à administração do nosso crescimento profissional em Cristo (Carol Kingston); e desde cuidar de alunos em ambientes multisseriados (Andrea Sayler) até cuidar de suas vidas de oração na faculdade e universidade (Ramona Hyman e Malya Prather). Como educadores adventistas, administradores educacionais e funcionários na linha de frente da missão, temos um mandato: fazer das nossas escolas lugares onde todos os que entram ouçam o chamado de Jesus: “Vem e segue-Me!” Lugares onde todos os que entram sintam a impressão do Salvador no coração e pelas “cordas de Seu Amor”10 sejam atraídos a Ele.

O chamado de Jesus no Mar da Galileia ecoa através do tempo para cada um de nós hoje. Num mundo com tantas vozes clamando pela nossa atenção, que possamos ouvir claramente Aquele que chama, encontrar confiança na Sua promessa e nos dedicar à Sua missão.

Faith-Ann A. McGarrell

Faith-Ann A. McGarrell, PhD, é editora da Revista Educação Adventista®. Ela pode ser contatada em [email protected].

Citação recomendada:

Faith-Ann A. McGarrell, “‘Vem e segue-Me,’” Revista Educação Adventista 85:2 (2023). Disponível em: https://www.journalofadventisteducation.org/pt/2023.85.2.1.

NOTAS E REFERÊNCIAS

  1. Todas as referências bíblicas neste editorial são citadas da Nova Versão Internacional da Bíblia. Bíblia Sagrada, Nova Versão Internacional®.
  2. The Blue Letter Bible, “Lexicon: Strong’s G190” (2023). Disponível em: https://www.blueletterbible.org/lexicon/g190/kjv/tr/0-1/. Veja também Knowing Jesus (2023). Disponível em: https://bible.knowing-jesus.com/strongs/G190 e Strong’s Concordance with Hebrew and Greek Lexicons, “Follow” (2023). Disponível em: https://www.eliyah.com/lexicon.html; Merriam-Webster Dictionary, “Follow” (2023). Disponível em: https://www.merriam-webster.com/dictionary/follow.
  3. John S. McCallum, “Followership: The Other Side of Leadership,” Ivey Business Journal (set./out. 2013). Disponível em: https://iveybusinessjournal.com/publication/followership-the-other-side-of-leadership/; Neal Schaffer, “Social Media Demographics in 2023: What Marketers Need to Know in 2023” (2023). Disponível em: https://nealschaffer.com/social-media-demographics/.
  4. Springtide Institute, Belonging: Reconnecting America’s Loneliest Generation (2022). Disponível em: https://www.springtideresearch.org/research/belonging.
  5. Ibid.
  6. Ibid.
  7. Essa comissão é repetida em Mateus 28:19 e 20.
  8. Riley Manning, “Fish, Fishermen Hold Prominent Places in Scripture,” Marketplace (7 maio 2014). Disponível em: https://www.gadsdentimes.com/story/lifestyle/faith/2014/05/08/fish-fishermen-hold-prominent-places-in-scripture/32103995007/; Ray Vander Laan, “They Left Their Nets Behind,” That the World May Know (2023). Disponível em: https://www.thattheworldmayknow.com/they-left-their-nets-behind.
  9. Ellen G. White, Sons and Daughters of God (Washington, D.C.: Review and Herald, 1955), 128; Id., O Desejado de todas as nações, p. 255, 307. Disponível em: https://m.egwwritings.org/pt/book/1813.1036.
  10. Id., O Desejado de todas as nações, p. 249.