Patricia Schmidt Costa

Ensinando com a “transformação afetiva” em mente:

conectando a teoria com a prática

Com um quociente intelectual (QI) de 165, Theodore era um sonho realizado para todos os professores. Sua natureza inquisitiva e realizações acadêmicas permitiram que ele pulasse duas séries, entrasse na Universidade de Harvard aos 16 anos e obtivesse um doutorado em matemática aos 20 anos. No entanto, esse aluno peculiar, considerado por alguns como um gênio, também era socialmente desajeitado e emocionalmente e profissionalmente disfuncional.1 Embora Theodore tenha se oferecido para ser psicanalisado quando era estudante em Cambridge, ninguém suspeitava que ele se tornaria um assassino famoso e ameaçador, cujas cartas-bombas anônimas aterrorizariam muitas pessoas por 17 anos. De acordo com sua autobiografia, Theodore Kaczynski, também conhecido como o Unabomber, matou três pessoas e feriu pelo menos 12 outras fisicamente em uma tentativa ilusória de colocar a América no caminho da liberdade. A tecnologia, ele argumentou, estava escravizando os humanos, e as bombas que ele criou, enviadas pelo correio e que detonavam nas mãos dos destinatários, eram sua maneira de transmitir uma mensagem.2

Os atos mórbidos de Kaczynski não podem ser justificados. Ele agiu na tentativa não de purgar sua tristeza devido ao abuso mental, provocação e incompetência social, mas para melhorar seu estilo de vida conturbado.3 No livro True Education, Ellen White escreveu que: “Há em nossa natureza uma inclinação para o mal, uma força que, sem ajuda, não podemos resistir. Para suportar esta força [...] podemos encontrar ajuda em apenas um poder. Esse poder é Cristo.”4 O caso de Kaczynski nos lembra que o mal existe e pode exercer um poder controlador sobre indivíduos cujo núcleo emocional humano é negligenciado. E, embora a negligência do afeto não transforme a maioria dos indivíduos em assassinos em série ou terroristas, a atenção ao afeto oferece uma oportunidade de influenciar as escolhas que os alunos farão na vida.

No entanto, as expectativas de qualidade acadêmica, horários agitados, referências importantes do professor e objetivos de aula planejados podem impedir os educadores de dar atenção adequada à “transformação afetiva” (ver Quadro 1) na educação. Compreender o afeto é fundamental para ajudar os alunos a entender por que eles têm certos sentimentos5 e é essencial na sala de aula de hoje. Theodore Kaczynski frequentou a escola quando as discussões sobre o impacto do afeto e das emoções eram poucas. Segundo Freire, os alunos sem emoção podem desenvolver comportamentos destrutivos e acabar fazendo ameaças para prejudicar a si mesmos ou a seus colegas. Ele afirmou: “O que é importante no ensino não é a repetição mecânica [...] mas a compreensão do valor dos sentimentos, emoções e desejos.”6 Dito de outra forma, a verdadeira educação envolve o desenvolvimento apropriado das influências mentais, físicas, intelectuais e emocionais de uma pessoa, mas, acima de tudo, ajuda os alunos a crescer em força espiritual.7 Concentrar-se nas emoções do aluno e do professor reduz a tensão e ajuda os alunos a se tornarem adultos empáticos e atenciosos.8 Os professores podem se beneficiar ao entender e aprender como aplicar as pesquisas mais recentes sobre a transformação afetiva na educação.9

A teoria afetiva

“Afeto” é uma reação física involuntária ou resposta do corpo a um estímulo.10 Afetos são ligações entre o corpo e o cérebro que começam quando o cérebro percebe uma situação que exige uma resposta emocional.11 De acordo com Frank e Wilson,12 Silvan Tomkins, o famoso psicólogo e teórico da personalidade, sugeriu três tipos de afeto: positivo, neutro e negativo. Cada um desses processos ocorre automaticamente abaixo do nível de consciência.13 A pesquisa de Tomkins o levou a identificar dois afetos positivos que os humanos têm: prazer-alegria e interesse-entusiasmo. Na área de afeto negativo ele identificou medo-terror, inquietação-angústia, raiva-fúria, vergonha-humilhação, repulsa e mau cheiro (uma reação ao odor desagradável), como resultado de incidentes com uma associação indesejável. De acordo com Tomkins, há apenas um afeto neutro, surpresa-sobressalto, que descreve o estado de prontidão instantânea para reação.14

Um total de nove expressões faciais universais correspondem aos vários afetos. Essas expressões faciais comuns estão presentes em bebês desde o nascimento. Por exemplo, ao experimentar prazer-entusiasmo, os humanos geralmente usam um sorriso, que é caracterizado pelas bordas dos lábios voltadas para cima. Olhos fixos e ouvidos atentos representam o afeto interesse-entusiasmo. Em contraste, o medo-terror produz sobrancelhas erguidas e olhos arregalados e chocados. Um afeto negativo, aflição-angústia, manifesta-se com choro, rosto vermelho e olhos fechados. Se a aflição-angústia não for apaziguada, nos bebês, e mesmo nos adultos, transforma-se em raiva-fúria, que está ligada a uma expressão facial exigente. Quando a vergonha-humilhação comove uma pessoa, os músculos do pescoço amolecem e a cabeça tende a abaixar para frente. Às vezes, a pessoa cobre o rosto em uma resposta automática de ocultação. A expressão facial relacionada ao nojo é uma expressão nauseada, comumente incluindo olhos fechados e língua para fora da boca. Esse afeto ocorre em relação a um sabor, ruído ou visual incômodo. O neologismo dissmell representa uma expressão não verbal peculiar que envolve afastar-se de um objeto desagradável, visível ou invisível, com um odor repulsivo. O afeto surpresa-sobressalto é considerado um afeto neutro.15 Ostrofsky explicou que os sinais visíveis do afeto surpresa-sobressalto envolvem “abrir os olhos para dar uma boa olhada e respirar rapidamente em preparação para a ação necessária”.16 O afeto surpresa-sobressalto é uma maneira muito breve e automática de comunicar sentimentos positivos ou negativos e, portanto, é considerado apropriadamente um afeto neutro.

Os afetos são produtos de estímulos; e eles também amplificam os estímulos. É importante que os educadores entendam que essas reações são respostas involuntárias e naturais que ocorrem em todas as interações sociais e em todos os aspectos da vida, incluindo ambientes educacionais.

Tanto os educadores quanto os alunos se envolvem com o currículo educacional. Mas seus corpos e mentes exigem mais do que um livro didático, um objetivo acadêmico, uma referência ou testes padronizados. Problemas e desafios psicológicos, sociais e políticos profundamente complexos são expostos em todas as aulas, todos os dias.17 O afeto é um assunto desafiador porque esse fenômeno é simultaneamente biológico (físico), neural, subjetivo, histórico, social e pessoal.18

Estudiosos, como Zembylas e Leys,19 consideram os termos afeto, emoções e sentimentos como sinônimos e intercambiáveis. Damasio sugeriu que é uma tarefa difícil escolher um único termo para descrever as emoções ou os “impulsos e motivações como estados de dor e prazer”20 que desencadeiam o que ele classificou como emoções profundas, primárias e secundárias. Na educação, os conceitos de afeto, sentimentos ou emoções podem ser usados de várias maneiras. Consequentemente, é essencial reconhecer as crenças sobre o afeto e aplicá-las ao buscar restaurar a quebra de comunicação entre educadores e educandos nas salas de aula de hoje.

A transformação afetiva na educação

Múltiplas disciplinas usam o afeto para influenciar efetivamente as pessoas e suas emoções. Essa influência pode ser positiva e edificante ou negativa e manipuladora. Professores e alunos devem aprender a reconhecer quando e como o afeto está sendo usado para influenciar decisões e escolhas. O ramo do entretenimento, por exemplo, induz o público a sentir emoções por meio da música, da fala e do movimento corporal. Os cineastas criam cenas de tristeza, dor, felicidade, surpresa, repulsa para produzir respostas que os produtores desejam gerar. Os atores não apenas internalizam as palavras de um roteiro, mas também devem encontrar maneiras de expressar essas palavras de forma expressiva e verossímil usando voz, mãos e expressões faciais para estimular e obter as respostas desejadas.21 Os políticos usam a teoria do afeto para criar campanhas eleitorais. Escritores e palestrantes especializados preparam discursos cheios de emoção usando palavras poderosas que influenciam a mente dos ouvintes. As emoções são respostas externas a experiências internas e externas. Isso significa que os afetos fazem com que o corpo responda de várias maneiras, como lágrimas, risos, surpresa ou raiva.

Massumi22 acreditava que o afeto deveria produzir uma mudança na forma como os alunos são socializados em sala de aula, e é isso que a escola e a educação devem atender no ciclo de ensino e aprendizagem. Certamente, a maneira como os professores usam o afeto pode trazer mudanças. Os educadores ensinam com palavras, muitas vezes não totalmente concretas. As palavras constroem ideias que ajudam a moldar e criar as identidades dos alunos. Às vezes, a forma como as palavras são expressas limita as possibilidades de pensamento subjetivo e abstrato. As crianças repetem o que ouvem na escola, em casa e na televisão. Eles repetem o que os afeta. Ao mesmo tempo, as palavras repetidas estão ligadas às suas experiências individuais. O corpo e a mente são estimulados a criar uma realidade – e simultaneamente usam essa realidade para tentar influenciar os outros.

É por causa do poder das emoções que o estudo do afeto se tornou objeto de investigação acadêmica. Os educadores estão “reunindo teorias de subjetividade e sujeição, teorias do corpo e corporeidade e teorias políticas e análises críticas de afeto e emoção.”23 Educadores estão sendo treinados para usar menos do que Freire chamou de “um discurso padrão dominante”24 e mais habilidades de pensamento crítico. Essa forma de instrução usa sentimentos, ideias e habilidades de construção de caráter. A transformação afetiva na educação vincula a parte emocional dos alunos com os aspectos sociais, psicológicos e culturais dos alunos.

A transformação afetiva na educação também aborda a relação entre as emoções e o que acontece na formação de professores. Estudiosos, como Gilles Deleuze, Baruch Spinoza, Blackman e Brian Massumi, sugerem que a transformação afetiva é mais do que apenas inserir emoção na pedagogia. A aprendizagem é uma modificação duradoura do comportamento que acontece por meio de experiências em movimento. Um tipo contínuo de afeto positivo, neutro ou negativo pode moldar o desempenho acadêmico do aluno de maneira positiva ou negativa. Nas escolas, os educadores têm o poder de usar a teoria afetiva para abordar as emoções dos alunos e influenciar as mentes com razão e paixão. Deve-se ter cuidado para garantir que essa influência seja usada de forma positiva, e não de forma manipuladora. Essa abordagem também afeta os educadores porque os afetos pertencem simultaneamente a ambos os lados da relação, os professores são aprendizes e também professores.25

Ao longo de minha extensa carreira como professora do ensino fundamental, fui profundamente tocada por muitos, se não todos, dos meus alunos. Algumas dessas memórias são narradas abaixo porque incluem o uso de afeto para produzir modificação de comportamento, melhorar o desempenho acadêmico, lidar com problemas de hiperatividade e atenção e integrar a tecnologia. Eu os compartilho para conectar a teoria do afeto com a prática de se voltar para o afeto na educação.

Faça acomodações para facilitar a modificação do comportamento

O afeto influencia como uma pessoa descobre o mundo e suas realidades felizes e tristes.26 Os relacionamentos são influenciados pelo afeto e pelo acúmulo de experiências emocionais de cada pessoa envolvida. Meu aluno, Manuel,27 constantemente implorava por atenção nas aulas. Caçula de sua família, ele teve a atenção de seus pais, irmãos mais velhos e avós. Eles gostavam de suas travessuras bem-humoradas, admiravam suas interjeições e elogiavam seu talento como comediante. Na escola, porém, interromper, fazer piadas e distrair a classe constantemente produzia afetos (respostas) negativos em mim, sua professora. No entanto, mantive meus sentimentos sob controle para tentar produzir afetos positivos em Manuel. Demorou um pouco para que o educador e o aluno (e nós dois éramos um pouco de cada) se conectassem e se conformassem um com o outro. Quer tratasse de pequenas recompensas, de elogios, ou de fazer de Manuel o protagonista de uma peça de teatro, as interações afetivas que eram continuamente revistas aconteceram ao longo do ano letivo. Como observou Wetherell, “os ciclos de prática afetiva podem persistir por um curto período ou podem durar e ser retrabalhados”.28 As práticas afetivas estão interligadas e podem formar padrões que finalmente produzirão hábitos mentais.29 A ciência por trás do processo emocional em humanos é explicada por Damásio no seguinte parágrafo:

“A punição faz com que os organismos se fechem, congelando e se afastando de seus arredores. A recompensa faz com que o organismo se abra para o ambiente. Aproximando-se dele, procurando-o e, ao fazê-lo, aumentando tanto sua oportunidade de sobrevivência quanto sua vulnerabilidade.”30

Manuel e eu recentemente nos conectamos através da mídia social. Em uma postagem pública, meu agora já adulto ex-aluno expressou que me considerava a professora favorita. Embora nem toda intervenção produza resultados bem-sucedidos, estou convencido de que, para ensinar com eficácia, deve haver uma conexão emocional – um trabalho estimulante31 – entre educador e aluno: “Afeto tem a ver tanto com sentido como com sensibilidade. É prático, comunicativo e organizado.”32 Há mais de um século, James33 concluiu que os educadores devem motivar e orientar os alunos enquanto identificam suas aptidões para elevar seu autoconceito. O autoconceito é como as pessoas se sentem em relação a si mesmas, e é possível que os educadores evitem que os alunos sintam vergonha pessoal por serem eles mesmos.

Reconheça o impacto do afeto no desempenho acadêmico

Quando comecei a lecionar, há mais de 30 anos, pensei que poderia mudar o mundo. Eu aspirava fazer com que meus alunos se sentissem bem com as características mentais e sociais positivas que eles incorporavam. Como Clough et al. afirmou, eu era um corpo em movimento com “mais paixão pela vida do que você jamais experimentou”.34 Como professora novata, fiz muitas escolhas impopulares para ajudar os alunos que eu sabia que eram afetados negativamente. Deixei meu sistema nervoso “reagir de maneiras particulares ao contato com características particulares do ambiente [de minha sala de aula]”.35 Na maioria das vezes, saí da experiência com resultados positivos, embora nem sempre tivesse sucesso em minhas tentativas de ajudar.

Lembro-me de como uma aluna, Diana, começou a balançar para frente e para trás de maneira monótona durante as aulas. Foi perturbador porque suas experiências acadêmicas estavam sendo prejudicadas por esse comportamento. Ela se recusou a se envolver no aprendizado. Depois de tentar várias abordagens sem sucesso, finalmente, um dia eu a segurei no colo, apesar do fato de que isso é desaprovado pelos professores hoje em dia. Essa abordagem a ajudou a relaxar e se sentir à vontade para narrar detalhes comoventes sobre a infidelidade de seu pai e sua subsequente saída de casa.

A família de Diana enfrentou várias dificuldades de relacionamento e financeiras. Um desses desafios tinha a ver com encontrar fundos para comprar um vestido para ela usar em um programa escolar. Não fui capaz de mudar a situação familiar dela, mas poderia tentar mudar seu senso de autoimagem e orgulho. A maioria das alunas na sala de aula estava se gabando de suas roupas novas; no entanto, Diana não tinha uma roupa nova, o que afetou seu senso de valor próprio. Os teóricos do afeto apontam que as comparações interpessoais podem ter um efeito significativo no bem-estar emocional das pessoas: “O afeto é [...] uma energia que pode ser estimulada ou amortecida no decorrer da interação.”36

No final de um dia de aula, na hora da saída, eu segurava um envelope na mão e pedia doações. Isso foi feito sem que os outros soubessem que era para ajudar Diana a comprar um vestido novo. Liguei para a mãe dela para avisar que a levaria para comprar um vestido, que foi comprado, milagrosamente, com o valor exato arrecadado. Diana ficou exultante após a experiência. Os movimentos de balanço do pêndulo cessaram, e seu desempenho acadêmico prosperou. Os problemas em casa continuaram, mas ela sabia que era cuidada na escola; portanto, seu aprendizado melhorou. Diana manteve o rosto erguido no programa escolar em seu lindo vestido azul-marinho estilo náutico, e, como professora dela, eu também.

Cada aluno é único. Não acredito que os educadores devam quebrar as regras, como fiz no início da minha prática educativa, para ajudar os afetos dos alunos. No entanto, acredito que todo educador deve estar atento à atmosfera da sala de aula. Salas de aula inclusivas centradas no aluno fazem parte da mudança afetiva na educação. Conseguir isso requer que cada educador se envolva em autorreflexão diária e automonitoramento para estimular reações afetivas positivas e discernir o que os alunos estão tentando dizer com ou sem palavras na sala de aula.37

Aplique uma variedade de estratégias e intervenções

Leys e outros38 postulam que a emoção e a cognição estão ligadas. Emoções perturbadas, portanto, levam a problemas de raciocínio e compreensão na escola. Para evitar o fracasso escolar de alunos com transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), que também exibem atitudes desordenadas por causa de um histórico familiar, cultural, social ou outro tipo de trauma, a solução mais comum parece ser a medicação.39

Quando conheci Levi, ele era um aluno enigmático, inteligente, mas impulsivo, em uma de minhas turmas do 4º ano. No entanto, desde o primeiro dia, percebi que havia uma história por trás dos rumores de que ele tinha TDAH. Rumores sobre os problemas comportamentais de um aluno, de acordo com Anderson, Gregg e Seigworth,40 podem aumentar a ansiedade e levar à desilusão em crianças, professores e funcionários da escola. Foi exatamente assim que percebi o estado emocional de Levi: apreensivo e desapontado.

Um mês depois do início do ano letivo, aprendi mais sobre Levi. Nesse ponto de sua vida, ele tomava duas pílulas estimulantes prescritas. Uma terceira droga cuidava da sua ansiedade, pensamento irracional e pesadelos. A medicação acalmou seu comportamento na aula, e ele parecia focado em aprender. No entanto, além de seu estado emocional, Levi lutava com seu peso e ansiava por alimentos processados ​​não saudáveis.

Como resultado do ambiente de sala de aula, Levi começou a acreditar que era valorizado e logo foram feitas mudanças para reduzir sua medicação para um comprimido pela manhã nos dias de aula. Lentamente, à medida que ele e seus pais aprendiam mais sobre alimentação saudável, ele reagiu ao que estava aprendendo e passou a comer mais frutas, verduras e legumes como parte de sua dieta diária. Além disso, eu passava um tempo de qualidade com ele depois da escola, fazendo as tarefas de casa e envolvendo-o nos esportes. Como parte de uma programação estruturada, ele participava de leituras da Bíblia e orações todas as noites. Os resultados foram significativos. Não apenas a atitude de Levi em relação à vida mudou, mas ele também fez melhorias acadêmicas, perdeu peso e afetou positivamente minha vida como sua professora.

A teoria da transformação afetiva vem com um risco associado. O controle de corpos medicados é desafiador, pois pais e educadores nem sempre têm as ferramentas para lidar com a situação.41 Felizmente, o médico de Levi ficou satisfeito com os resultados de menos medicamentos, uma dieta mais saudável, um ambiente estruturado e mais apoio emocional para ele. Com o passar do tempo, eu também experimentei efeitos positivos ao ver Levi se transformar em uma criança muito mais saudável, confiante e emocionalmente equilibrada.

Usando a tecnologia para melhorar a mudança de efeito na educação

Os estilos de ensino são emocionalmente distintos e são uma parte significativa das experiências passadas de um aluno. Os educadores que modificam deliberadamente seus estilos de ensino para acomodar alunos peculiares colherão os benefícios. A prática afetiva concentra-se nas emoções conforme elas aparecem na vida e nas ações dos alunos e os ajuda a encontrar sua voz.42 “Voz” geralmente se refere à forma audível de se comunicar, mas também pode ser expressa por escrito. Usando palavras, os educadores tentam entender os sentimentos que os alunos trazem para a sala de aula. Mas, quando os alunos são não verbais e incapazes de usar lápis ou canetas para escrever com clareza, é difícil entender suas emoções e seus afetos.

Zack era um aluno não verbal e não comunicativo que eu só conseguiria alcançar modificando meu estilo de ensino. Um blog de sala de aula foi criado para ajudar Zack a se comunicar de forma afetiva e eficaz. Por meio de suas postagens, ele expressou atitudes positivas sobre ciência, artes da linguagem e tópicos de estudos sociais. Blackman43 explicou que as vozes têm potencial para revelar o afeto nos alunos e moldá-los por meio da história pessoal.

Alguns estudiosos se concentram em como um humor positivo ajuda a induzir o pensamento que envolve maior criatividade e flexibilidade durante a resolução de problemas. Provérbios 17:22 diz: “O coração alegre é bom remédio. (ARA).44 Zack foi capaz de dominar habilidades, como aprender os estados e capitais dos Estados Unidos, regras de capitalização e as camadas da atmosfera. Ele não apenas dominou uma variedade de habilidades, mas também foi capaz de refletir sobre as atividades, exibindo então, emoções. “Gosto do blog, professora. É legal”, escreveu ele em seu primeiro post. Uma conexão foi feita. Interpretei o comentário positivo de Zack como seu desejo supremo: “Eu sei o que é desejo. Eu conheço o desejo. Eu também quero liberdade. Sinto o impulso da liberdade dentro de mim, subindo pela minha garganta, pulsando. Eu quero. Alívio.”45 Para Zack, a combinação físico-digital do blog ampliou seu leque de conhecimento. A experiência da tecnologia nesse estilo de ensino apoiado pelo afeto permitiu que ele tornasse o abstrato concreto.46 Isso deu a Zack sentimentos de abertura para experimentar a liberdade em sua jornada acadêmica.

Professores e a transformação afetiva na educação

A aprendizagem recíproca entre educador e aluno leva a um maior valor e percepção para ambos. A transformação afetiva na educação é uma transação bidirecional que envolve, de acordo com Freire, “sonhos, utopias, ideias”.47 Concordando com Picard et al.,48 numerosos estudos ligam as relações interpessoais entre educadores e alunos à aprendizagem produtiva. Estratégias eficazes que apoiam relacionamentos saudáveis e aprendizado produtivo incluem a utilização de formulários de perfil do aluno no início do período letivo, que fornecem aos educadores informações valiosas sobre cada estudante. Criar um ambiente acolhedor, afirmar a diversidade e reservar um tempo para fazer com que todos os alunos se sintam valiosos são fatores que desempenham papéis importantes no desenvolvimento socioemocional dos alunos, bem como em seu desempenho acadêmico.49

Os professores que lutam com a natureza afetiva do ensino podem se beneficiar ao contemplar o exemplo do professor por excelência, Jesus Cristo, que “era um observador atento, observando muitas coisas que os outros não percebiam. Ele sempre foi prestativo, sempre pronto para falar palavras de esperança e solidariedade aos desanimados e enlutados.”50 Jesus mostrou pelo exemplo que “o verdadeiro objetivo da educação é restaurar a imagem de Deus na alma”.51 Professores que se concentram em observar, perceber, ajudar e restaurar os alunos entendem que em “fazer a vontade de Deus” (Mt 6:33, ICB),52 todas as outras coisas (acadêmicas, padrões e referências, desempenho em testes) serão alcançadas por cada aluno.

Os educadores também se beneficiam ao viver de acordo com o que o rei Salomão escreveu há milhares de anos: “Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o coração, porque dele procedem as fontes da vida” (Pv 4:23, ARA). Guardar o coração contra os afetos negativos no ensino e na aprendizagem, como tristeza e raiva, é importante não apenas para evitar a sensação de sobrecarga, mas também para aprender a lidar adequadamente com essas emoções. As histórias angustiantes que os alunos trazem para a sala de aula continuam a afetar os corações dos educadores, não importa quanto tempo ensinem, mas a experiência os ajuda a lidar com a dor.

Conclusão

As histórias pessoais deste artigo foram compartilhadas para exemplificar como a transformação afetiva na educação é importante para valorizar os sentimentos, emoções e sonhos dos alunos. A verdadeira educação inclui levar em consideração o aprendizado social e emocional, não apenas para ter filhos atenciosos dentro e fora das salas de aula, mas também para futuros adultos compassivos. Nossa tendência humana natural para o mal é exemplificada em Theodore Kaczynski, e o único antídoto para isso é o caráter de Deus restaurado no coração humano. A filosofia adventista da educação declara: “A educação em seu sentido mais amplo é um meio de restaurar os seres humanos ao seu relacionamento original com Deus.”53

A transformação afetiva não ocorre por causa de um maior desenvolvimento profissional ou pela aquisição do mais recente dispositivo de ensino. É uma interação complexa entre educador e aluno em nível pessoal e, para o educador adventista, uma colaboração com o divino. O afeto pode modificar comportamentos, melhorar os esforços acadêmicos, ajudar os jovens com uma ampla gama de problemas comportamentais e emocionais e permitir que os alunos encontrem sua voz no mundo acadêmico. Os educadores devem lembrar que o conhecimento deve ser compartilhado com uma mente crítica, mas também com sentimentos, intuição, emoções e autorreflexão.54 Então, eles serão capazes de implementar efetivamente a transformação afetiva na educação.


Este artigo foi revisado por pares.

Patricia Schmidt Costa

Patricia Schmidt Costa, PhD, é uma educadora com vasta experiência no ensino fundamental em escolas adventistas do sétimo dia. Ela é apaixonada por estudar a alfabetização de afeto, promover a defesa dos estudantes e apoiar a educação bilíngue. A Dra. Costa é doutora em Currículo e Instrução pela Texas Tech University, em Lubbock, Texas, Estados Unidos. Atualmente mora em Louisiana e trabalha on-line como professora adjunta do Departamento de Ensino e Aprendizagem no American College of Education (Indianapolis, Indiana, Estados Unidos).

Citação recomendada:

Patricia Schmidt Costa, “Ensinando com a ‘transformação afetiva’ em mente: conectando a teoria com a prática,” Revista Educação Adventista 84:4 (2022). Disponível em: https://www.journalofadventisteducation.org/pt/2022.84.4.2.

NOTAS E REFERÊNCIAS

  1. David Kaczynski, Every Last Tie: The Story of the Unabomber and His Family (Durham, N.C.: Duke University Press, 2016).
  2. Estas ideias foram compartilhadas na obra de Theodore Kaczynski: “The Unabomber Manifesto: Industrial Society and Its Future” (1995). Disponível em: https://www.amazon.com/Unabomber-Manifesto-Industrial-Society-Future/dp/1595948155.
  3. Amy Mullin, “Narrative, Emotions, and Autonomy,” in Narrative, Emotion, and Insight, Noël Carroll and John Gibson, eds. (University Park, Penna.: The Pennsylvania State University Press, 2011), 92-108.
  4. Ellen G. White, True Education: Adaptation of Education by Ellen G. White (Nampa, Idaho: Pacific Press, 2000), 21.
  5. Michalinos Zembylas, “Making Sense of the Complex Entanglement Between Emotion and Pedagogy: Contributions of the Affective Turn,” Cultural Studies of Science Education 11:3 (2010): 539-550. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/284836880.
  6. Paulo Freire, Pedagogy of Freedom: Ethics, Democracy, and Civic Courage (New York: Rowman and Littlefield Publishers Inc., 1998), 25.
  7. White, True Education, p. 12.
  8. Stephanie M. Jones, Suzanne M. Bouffard e Richard Weissbourd, “Educators’ Social and Emotional Skills Vital to Learning,” Phi Delta Kappan 94:8 (2013): 62-65.
  9. Zembylas, “Making Sense of the Complex Entanglement Between Emotion and Pedagogy: Contributions of the Affective Turn.”
  10. Ruth Leys, “The Turn to Affect: A Critique,” Critical Inquiry 37:3 (2011): 434-472. Disponível em: https://www.jstor.org/stable/10.1086/659353.
  11. Antonio R. Damasio, The Feeling of What Happens: Body and Emotion in the Making of Consciousness (New York: Harcourt, 1999); Margaret Wetherell, Affect and Emotion: A New Social Science Understanding (Los Angeles: SAGE Publications Ltd., 2012).
  12. Adam J. Frank e Elizabeth A. Wilson, A Silvan Tomkins Handbook: Foundations for Affect Theory (Minneapolis, Minn.: University of Minnesota Press, 2020).
  13. Leys, “The Turn to Affect: A Critique”; Wetherell, Affect and Emotion: A New Social Science Understanding.
  14. Frank e Wilson, A Silvan Tomkins Handbook: Foundations for Affect Theory.
  15. Ibid.
  16. Richard E. Ostrofsky, “Affect Theory, Shame and the Logic of Personality,” Sec Thoughts 4 (2003): 8. tinyurl.com/328h3tac.
  17. Brian Massumi, “The Autonomy of Affect,” Cultural Critique 31:31 (1995):83-109. Disponível em: http://links.jstor.org/sici?sici=0882-4371%28199523%290%3A31%3C83%3ATAOA%3E2.0.CO%3B2-W.
  18. Wetherell, Affect and Emotion: A New Social Science Understanding.
  19. Zembylas, “Making Sense of the Complex Entanglement Between Emotion and Pedagogy: Contributions of the Affective Turn”; Leys, “The Turn to Affect: A Critique.”
  20. Damasio, The Feeling of What Happens: Body and Emotion in the Making of Consciousness, 55.
  21. Donavan O. Schaefer, Religious Affects: Animality, Evolution, and Power (Durham, N.C.: Duke University Press, 2015).
  22. Massumi, “The Autonomy of Affect.”
  23. Zembylas, “Making Sense of the Complex Entanglement Between Emotion and Pedagogy: Contributions of the Affective Turn,” 3.
  24. Paulo Freire, Pedagogy of the Oppressed (New York: Continuum, 2009), 20.
  25. Patricia T. Clough, Jean Halley e Michael Hardt, The Affective Turn: Theorizing the Social (Durham, N.C.: Duke University Press, 2007).
  26. Melissa Gregg e Gregory Seigworth, The Affect Theory Reader (Durham, N.C.: Duke University Press, 2010).
  27. Os nomes usados são pseudônimos.
  28. Margaret Wetherell, Affect and Emotion: A New Social Science Understanding, 12.
  29. Arthur L. Costa e Bena Kallick, Habits of Mind Across the Curriculum. Practical and Creative Strategies for Teachers (Alexandria, Va.: ASCD, 2009).
  30. Damasio, The Feeling of What Happens: Body and Emotion in the Making of Consciousness, 78.
  31. Clough, Halley e Hardt, The Affective Turn: Theorizing the Social.
  32. Wetherell, Affect and Emotion: A New Social Science Understanding, 13.
  33. William James, “What Is an Emotion?” Mind 9:34 (abr. 1884): 188-205. Disponível em: http://www.jstor.org/stable/2246769.
  34. Clough, Halley e Hardt, The Affective Turn: Theorizing the Social, 62.
  35. James (1884), “What Is an Emotion?” Mind, 190.
  36. Clough, Halley e Hardt, The Affective Turn: Theorizing the Social, 232.
  37. Robert J. Marzano, Becoming a Reflective Teacher (Bloomington, Ind.: Marzano Research Laboratory, 2012).
  38. Leys, “The Turn to Affect: A Critique”; Margaret Wetherell, Affect and Emotion: A New Social Science Understanding; Tammy Pandina Scot, Carolyn M. Callahan e Jill Urquhart, “Paint-by-Number Teachers and Cookie-cutter Students: The Unintended Effects of High-stakes Testing on the Education of Gifted Students,” Roeper Review 31:1 (jan.–mar. 2009): 40-52. Disponível em: https://search.proquest.com/docview/206709676?accountid=7098; Jason Hughes, “Emotional Intelligence: Elias, Foucault, and the Reflexive Emotional Self,” Foucault Studies 8 (2010): 28-52: doi.10.22439/fs.v0i8.2942.
  39. A pesquisa mostrou que o TDAH está ligado a anormalidades genéticas e outros fatores de risco físico, como lesão cerebral, exposição a toxinas ambientais, uso de álcool e tabaco pela mãe durante a gravidez, parto prematuro e baixo peso ao nascer. Embora os educadores possam ver evidências comportamentais de TDAH em escolas e salas de aula, essas não são causas. Para saber mais, consulte Centros de Controle e Prevenção de Doenças, “What Is ADHD?” (9 ago. 2022). Disponível em: https://www.cdc.gov/ncbddd/adhd/facts.html#Causes.
  40. Ben Anderson, “Modulating the Excess of Affect: Morale in a State of ‘Total War,’” in The Affect Theory Reader, Melissa Gregg and Gregory Seigworth, eds. (Durham, N. C.: Duke University Press, 2010), 161-185.
  41. Gregg and Seigworth, The Affect Theory Reader.
  42. Zembylas, “Making Sense of the Complex Entanglement Between Emotion and Pedagogy: Contributions of the Affective Turn.”
  43. Lisa Blackman, Immaterial Bodies. Affect, Embodiment, Mediation (Los Angeles: Sage. 2012).
  44. Salvo indicação em contrário, todas as referências bíblicas neste artigo são citadas da versão Almeida Revista e Atualizada.
  45. Clough, Halley e Hardt, The Affective Turn: Theorizing the Social, 263.
  46. R. W. Picard et al., “Affective Learning: A Manifesto,” BT Technology Journal 22:4 (2004): 253-268. doi.10.1023/B:BTTJ.0000047603.37042.33.
  47. Freire, Pedagogy of Freedom: Ethics, Democracy, and Civic Courage.
  48. Picard et al., “Affective Learning: A Manifesto.”
  49. A dissertação da autora fornece discussão adicional sobre como cultivar ambientes eficazes que apoiem a aprendizagem afetiva. Ver Patricia S. Costa, “Dear Teacher, I’m Glad You Didn’t Die!”: An Autoethnography on Posthuman Affective Curriculum. Diss. de doutorado, Texas Tech University, 2020.
  50. Ellen G. White, “Our Elder Brother,” Manuscript 20, 1902, para. 9.
  51. Id., Patriarchs and Prophets (Mountain View, Calif.: Pacific Press, 1958), 566.
  52. Matthew 6:33. International Children’s Bible (ICB). The Holy Bible, International Children’s Bible® Copyright © 1986, 1988, 1999, 2015 by Thomas Nelson. Usado com permissão.
  53. “Seventh-day Adventist Philosophy of Education Policy,” General Conference Policy Manual (2003), 221-228 (Education – Departmental Policies: FE 05, FE 10). Disponível em: https://circle.adventistlearningcommunity.com/download/PhilStat2003.pdf.
  54. Freire, Pedagogy of Freedom: Ethics, Democracy, and Civic Courage.